O silêncio do Nada

Por obrigação auto-imposta escrevo qualquer coisa, sobre nada. Um Nada pode ser coisa boa, ou nada disso seria verdade se o descanso fosse “fazer nada”. Descanso, pois, escrevendo essas palavras sobre o nada que me inunda a mente, criativamente, sobre o coisa alguma. Nada a declarar, a frase de quem tem tudo a dizer que o incriminaria; não tenho nada para vestir, como diria a moça mimada e insegura de como seduzir sem transparecer a vadia que é por dentro; não tenho nada, como diz o doente em fase de negação de seu estado terminal; não tenho nada aqui, como diz o transeunte negando esmola para o faminto; nada aconteceu, diz o adúltero sobre a sua amante à esposa; aqui não tem nada para você, dizem os pais impacientes para as crianças curiosas; ele não escuta nada do que eu digo, choraminga a mãe superprotetora sobre seu filho em fase de descobrir o mundo por si. É, talvez o Nada não seja tão bom assim, se se traduz como omissão, mentira, negligência. Um nada reconfortante é uma espécie em extinção, já que existe a obrigação social de ser produtivo e o nada significa a falta de transformar o esforço em lucro para outrem.

Talvez o Nada seja somente uma imagem mental, como o é o preto e o branco absolutos, ou o Bem e o Mal, o ponto, a linha e o apeirógono. Sempre gesta algo; um tipo de aninhamento energético que de repente explode numa ideia genial ou na constatação de que não se pode escrever um nada, por ser por si só um escrito, como a definição sussurrada do silêncio.

07/06/2015

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